quinta-feira, 7 de maio de 2015

TEMPLÁRIOS/GNOSTICISMO/CATARISMO/CABALA




Para além da história económica e política

Falar de Templários é falar de mistérios, falar de uma instituição que nasceu e cresceu num momento em que se dá um cruzamento entre Religião, Filosofia, Arte e Tradição particularmente profícuo mas também conflituoso. Os Templários têm sido vistos e imaginados de muitas formas, umas lisonjeiras, outras maléficas, outras mítico-mágicas. No entanto, se quisermos perceber mais um pouco desse “caldeirão cultural” em que a Ordem do Templo se formou e desenvolveu, e perceber porque razão foram condenados e castigados pelo Papa Clemente V, como heréticos, há que compreender também que o contato que os cavaleiros do Templo tiveram com as culturas do Oriente nos séculos XII e XIII, os levou a encontrar restos/fragmentos das crenças gnósticas, quer na Palestina quer nas suas sobrevivências especialmente vivas na Grécia, em Constantinopla e em Alexandria.
A Gnose enquanto movimento filosófico nasce entre os Gregos, muito influenciada pelo Platonismo, pelo Pitagorismo, pelos Mistérios de Elêusis, e defende a possibilidade de um conhecimento integral do mundo e dos princípios que o regem implicando uma compreensão que é também auto-conhecimento, o que hipoteticamente nos aproximaria da divindade. Para atingir a Sabedoria eram necessárias várias vias, sendo uma delas a reencarnação.
Desde muito cedo (séculos II e III da era cristã) que as crenças gnósticas estão, presentes em todos os debates e heterodoxias esmagadas progressivamente pela ortodoxia da igreja que se vai construindo como instituição.
Um dos indícios da existência de crenças gnósticas entre os cavaleiros do Templo é a utilização do abraxas, símbolo gnóstico composto por um personagem cujo corpo está coberto por uma armadura, terminando com um vestido curto, donde saem, em vez de duas pernas, duas serpentes, cada uma com duas cabeças. Em geral, a personagem tem na mão esquerda um escudo redondo ou oval, onde estão inscritas as letras sagradas I A O ou A O I ou I A ÓMEGA, e, na outra mão, um chicote que é o do deus egípcio Amon-Ra, símbolo da firmeza, do governo, do poder, da lei, do império sobre os seres e as coisas, o ceptro chicote de Amsu. Esta personagem tem uma cabeça de galo voltada para o céu, lembrando o canto matinal ao Sol.
Entre os selos da Ordem há um, guardado nos Arquivos Nacionais de França, onde figura claramente um abraxas acompanhado pela menção Secretum Templi, e encimado pela cruz da Ordem.
Paul de Saint-Hilaire, numa obra dedicada aos selos dos Templários, refere também a existência da palavra abraxas gravada em cruzes templárias e lembra que”mais de um décimo das impressões deixadas pela Ordem do Templo são entalhes gnósticos dos primeiros séculos, recuperados e montados em selos”. Todos figuravam em selos postos em documentos com datas entre 1210 e 1290.
Na Idade Média, os Cátaros foram os principais representantes das doutrinas gnósticas no Ocidente, e é muito interessante constatar que o desenvolvimento do catarismo em França tenha ocorrido essencialmente nos locais onde os Templários, desde a criação da Ordem registaram o seu maior progresso – no Languedoc e em Champagne.
Como é sabido, para os Cátaros, Deus não pode estar ligado à matéria, o plano da sua realidade é incomparavelmente mais elevado, não podendo estar imiscuído nem na criação material nem na encarnação das almas. Assim, para que as almas pudessem ser salvas Deus teria criado uma emanação de si, para fazer uma ponte entre o céu e a terra – Cristo. Ser “perfeito” não era mais do que um estado preparatório, pois que só pelo consolamentum se recebia a salvação.
Não conhecemos a essência desse sacramento apenas conhecemos as fórmulas do rito e a exigência de uma reunião de homens purificados, sendo o conteúdo espiritual transmitido por um perfeito que o recebera ele próprio de acordo com uma cadeia que se julgava ininterrupta. Um beijo simbólico selava a transmissão de uma vida superior e era o sinal visível da corrente de amor que passava de uns para os outros. Para alguns autores, o consolamentum era o “segredo de Jesus”, o espírito do “Graal”. Na encarnação de Cristo, os cátaros apenas viam um valor simbólico que apenas poderia ter ocorrido em imagem, sem realidade carnal, dado que Deus não podia encarnar na matéria. E, isso também podia muito bem estar de acordo com o ritual de negação de Cristo, que inegavelmente existiu na Ordem, ainda que os testemunhos recolhidos provem que, pelo menos nos últimos anos, aqueles que o praticavam não sabiam verdadeiramente o que faziam. Em 1136, a regra da Ordem foi modificada sendo autorizada a receber no seu seio os excomungados, com a única reserva de que tivessem manifestado arrependimento. Isto permitiu, pois, aos Templários receberem cátaros, tanto mais que não tinham mostrado muita pressa em ajudar os barões do norte na sua cruzada contra os Albigenses.
Não resta também dúvida de que os Templários mantiveram uma relação bastante estreita com os intelectuais das aljamas judaicas, nomeadamente no reino de Castela e de Aragão, onde se estudava a Cabala – uma forma de estudar misticamente as Escrituras, para extrair delas o sentido último da criação da vida e identificar-se com ele.
Simbolicamente, este sentido confundia-se com a possibilidade alquímica de criar, materialmente, essa mesma vida.
Há vários indícios que podem conduzir à suspeita fundamentada de que os Templários beberam em fontes cabalísticas e, em mais de um aspeto, exprimiram esse seu conhecimento em símbolos adotados por eles, aos quais se atribuiu uma interpretação diferente da que os mesmos podem ter quando analisados do ponto de vista esotérico da Cabala. Um desses sinais é precisamente o bafomet , que não seria objeto de adoração idolátrica mas um elemento de meditação , em muitos casos, na sala de reuniões das comendas.
O bafomet é uma representação de uma cabeça, muitas vezes de caráter andrógino,.e uma caveira ou uma cabeça, com barba, e também, por vezes, um pentáculo salomónico.
Também o sinete templário, representando dois cavaleiros montando um único cavalo, o que foi interpretado como um sinal de pobreza – o que é uma interpretação não só falsa como gratuita – coaduna-se bastante com uma leitura cabalística em que Yavé, o criador da Cabala, defende que um único homem não está em condições de apreender inteiramente o seu sentido, portanto escolhe um companheiro e dedica-se a meditar sobre ele a fim de o compreender. O cavalo constitui uma representação oculta dos segredos cabalísticos, que se repetiu ao longo da iconografia e dos mitos medievais.
Muitos são os indícios que nos permitem pensar que existiram razões, para além das óbvias ambições económicas e políticas, para a condenação e extinção da Ordem do Templo, por parte da Igreja, sendo que é certo que o mais temido é aquilo que se desconhece, e, logicamente, quem possua saber desse mesmo desconhecido.
O sagrado acha-se intimamente ligado ao secreto e, isto porque, em última análise, esse sentido da transcendência para o qual tende qualquer crença religiosa representa, para o ser humano, um mistério total e intransponível. A crença originou temor ou, melhor, é uma fonte desse temor – o medo último da morte e do que se possa encontrar por detrás dela.
E esse mesmo medo visceral criou a dependência do Homem em relação àqueles que tiveram – ou aparentaram ter – conhecimento certo do chamado Além.
Texto: Isabel Gualdino
Fotos: retiradas da Internet




Sem comentários:

Enviar um comentário